Laranja, peso, potência.
Que se finca, se apoia, delicadeza, fria abundância.
A matéria pensa. As madeiras
incham, dão luz. Apuram tão leve açúcar,
tal golpe na língua. Espaço lunado onde a laranja
recebe soberania.
E por anéis de carne artesiana o ouro sobe à cabeça.
A ferida que a gente é: de mundo
e invenção. Laranja
assombrosamente. Doce demência, arrancada à
monstruosa
inocência da terra.
Herberto Helder
Um blogue da professora Risoleta C. P. Pedro para e com os trabalhos dos seus alunos- Escola Secundária Artística António Arroio
sábado, 28 de abril de 2012
segunda-feira, 23 de abril de 2012
segunda-feira, 16 de abril de 2012
Sumários das aulas da semana de 10 de abril
A poesia de Cesário: revisão- a natureza, a mulher, a poetização do real, o demabular, a transfiguração do real, a crítica e a ironia.
Leituras analíticas e expressivas.
Leituras analíticas e expressivas.
segunda-feira, 9 de abril de 2012
Pessoa/Caeiro, sobre Cesário Verde
Ao entardecer,
debruçado pela janela,
E sabendo de
soslaio que há campos em frente,
Leio até me arderem
os olhos
O livro de Cesário
Verde.
Que pena que tenho
dele! Ele era um camponês
Que andava preso em
liberdade pela cidade.
mas o modo como
olhava para as casas,
E o modo como
reparava nas ruas,
E a maneira como
dava pelas cousas,
É o de quem olha
para árvores,
E de quem desce os
olhos pela estrada por onde vai andando
E anda a reparar
nas flores que há pelos campos...
Por isso ele tinha
aquela grande tristeza
Que ele nunca disse
bem que tinha,
Mas andava na
cidade como quem anda no campo
E triste como
esmagar flores em livros
E pôr plantas em
jarros...
Alberto Caeiro, O Guardador de Rebanhos,
Poema III, in Obras de Fernando Pessoa,
vol. I, Lello & Irmão - Editores, Porto, 1986
Escrita criativa: Cesário pintor
Pintar a poesia de
Cesário Verde (l.1-8, p.298)
I
Ave Marias
“nas nossas ruas,
ao anoitecer,
Há tal soturnidade, há tal melancolia,
Que as sombras, o bulício, o Tejo, a maresia
Despertam-me um desejo absurdo de sofrer.
O céu parece baixo e de neblina,
O gás extravasado enjoa-me, perturba;
E os edifícios, com as chaminés, e a turba
Toldam-se duma cor monótona e londrina”
Leio este poema e parece que as suas palavras se transformam
em algo belo e harmonioso, algo vibrante e atual, parece que o que as palavras
descrevem ganham vida e se tornam parte do nosso mundo.
Mas olhando bem, sem turvar a nossa vista, conseguimos
ver cada traço, cada pincelada, cada reflexo daquele que é o mundo em que
vivemos.
Olhava de um quarto de uma casa alugada, com uma vista
panorâmica da cidade de Lisboa, que era uma vantagem de só existir espelho
entre ela e eu.
No meio deste quarto vazio encontrava-se um cavalete com
alguns anos de uso, com algumas manchas de tinha que eram prova das grandes
obras que tinha ajudado a criar, proporcionando um melhor conforto ao artista.
Ao seu redor encontravam-se algumas latas de tinta
e pincéis que eu deixara espalhados desde a última vez que criara algo, e uma
simpática cadeira que encontrara abandonada nas ruas desta cidade, mas em ótimo
estado, como se ela quisesse que eu a encontrasse.
Acomodei-me na cadeira, peguei num pincel já um bocado
enferrujado e deleitei-me com a paisagem noturna e maravilhosa da cidade. Estava cada vez mais bonita a cada noite que passava, embora esta não mudasse
realmente o que era.
Olhava intermitentemente para a tela presa ao cavalete e
aquele espetáculo de luzes a que costumava assistir todas as noites antes de me
ir deitar; isso proporcionava-me sonhos maravilhosos.
Lembrando-me das confortante sensações que obtinha dos sonhos depois de um dia exaustivo, abri uma lata de tinta que tinha comprado há já uns
dias e deixei-me levar pelos sons, pelos cheiros, pelos sabores e pelas
texturas da cidade.
Um rádio tocava e o pincel dançava suavemente pela tela
áspera, enquanto nascia uma obra como nunca ninguém teria visto.
Enquanto criava os prédios envoltos numa espessa
neblina que nos deixava contemplar a arrepiante Lisboa noturna, a música
mudou e com ela os movimentos do pincel tornaram-se vigorosos e precisos e começavam agora a criar a escuridão dos becos e das silhuetas que andavam
rapidamente pelos passeios, para se refugiarem do perigo da noite; numa última
mudança de sonoridade o pincel acalmou, e os seus movimentos eram minuciosos e
fluidos, criando assim os reflexos e os traços de luz deixados pela pouca
iluminação que lutava contra a escuridão.
Como não sabendo da existência desta obra, arregalei os olhos
a esta minha maravilhosa criação, desacreditando da minha própria capacidade de
criar algo tão belo e ao mesmo tempo tão arrepiante.
Este quadro apresentava traços esfumados e suaves, que
fariam com que qualquer lugar adquirisse o mistério e fascínio da cidade.
Patrícia, 11º D
Cesário e a mulher
Temos falado da mulher citadina, a propósito de Cesário. Aqui vai a outra, o contraponto:
Naquele piquenique de burguesas...
Naquele piquenique de burguesas,
Houve uma coisa simplesmente bela,
E que, sem ter história nem grandezas,
Em todo o caso dava uma aguarela.
Foi quando tu, descendo do burrico,
Foste colher, sem imposturas tolas,
A um granzoal azul de grão de bico
Um ramalhete rubro de papoulas.
Pouco depois, em cima duns penhascos,
Nós acampámos, inda o sol se via;
E houve talhadas de melão, damascos
E pão de ló molhado em malvasia.
Mas, todo púrpuro, a sair da renda
Dos teus dois seios como duas rolas,
Era o supremo encanto da merenda
O ramalhete rubro das papoulas
Houve uma coisa simplesmente bela,
E que, sem ter história nem grandezas,
Em todo o caso dava uma aguarela.
Foi quando tu, descendo do burrico,
Foste colher, sem imposturas tolas,
A um granzoal azul de grão de bico
Um ramalhete rubro de papoulas.
Pouco depois, em cima duns penhascos,
Nós acampámos, inda o sol se via;
E houve talhadas de melão, damascos
E pão de ló molhado em malvasia.
Mas, todo púrpuro, a sair da renda
Dos teus dois seios como duas rolas,
Era o supremo encanto da merenda
O ramalhete rubro das papoulas
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