Columbano "O Sarau"
Escutando Lisboa no Sarau – João Ega
Foi num dia como outro
qualquer, numa noite igual a tantas outras onde a Lisboa se apresentava despida
do costumado cansaço, povoada de gentes aperaltadas que me dirigi para mais um
dos controversos saraus de Lisboa.
Surpreendido pela
quantidade de pessoas que até ali se dirigiram na esperança de provar o seu
intelecto, ou quem sabe de se salvar da ignorância, nem que fosse por uma noite
banhada pelas luzes do palco nadei entre essas gentes. As aclamadas madames atiradas e espremidas dentro
dos espartilhos, os homens interpretando o papel de gentlemen acudiam ao som
que parecia vir de dentro da velha caixa de portões austeros e janelas altas ao
estilo lisboeta.
Ultrapassei o portão
entre vestidos que roçando pelo chão o pareciam enamorar e rapidamente
assegurei o meu lugar para o espetáculo que se avizinhava.
Só então me dei conta
que ao meu lado estava o estupor do Dâmaso!
Uma das pessoas que com certeza se dirige a estas pérolas de cultura para
se safar da habitual ignorância.
Desci o mais que pude
a minha cartola revoltada de maneira a tapar o meu perfil denunciador e puxei o
mais alto que pude a gola do casaco quase até repuxar a costura debruada a um
galão dourado como o candelabro que estava seguro por cima da minha cabeça.
Assim fiquei ali
sentado com aquele aspeto tão ridículo quanto as pessoas que me rodeavam.
Começou finalmente a
música. Tentei escutá-la convencido de
que aquilo era o suprassumo da cultura do agora!
Mas o barulho só
aumentava, as pessoas abafavam a música numa mostra de poder em que eles e elas
se interpelavam num jogo de gestos e corpos confusos.
Os sorrisos cínicos,
os olhares comprometidos de amantes trapaceiros aceleravam o compasso da música
que parecia indicar o final eminente da peça, a mulherzinha obediente ao marido
que discretamente lança olhares de fúria entre pequenos safanões do leque de
plumas e brocado que faz uma corrente de ar capaz de fazer regelar as cordas
tímidas e agudas do violino.
Os compassos lentos,
as mãos suaves a percorrer o corpo dos instrumentos como as mãos de um homem
percorrem a nudez de uma amada parecem agora mais brutas. O compasso acelera, o maestro agita a batuta
como se fosse combater com o insonso pauzinho de madeira para a guerra e eu
continuo escutando. Escutando aquela
coisa que é música que no meio desta gente, que no ventre desta Lisboa não
passa senão de ruído de fundo aos ouvidos destes animais que sem ponta de
civilização a usam para ambientar uma vida arcaica retirada de um daqueles
livros que deitei fora a semana passada!
Sim … uma vida retirada de um daqueles livros românticos insuportáveis
que sem razão parecem ser o retrato desta Lisboa.
Revoltado fugi daquela
realidade que parecia assombrar a existência do Homem civilizado.
Acabei por não ouvir
música nenhuma, fui apenas mais uma vez escutar Lisboa.
Inês Gomes nº 13
11º D
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