Visão de José
Saramago
Foram dar ao Largo Camões entre
as oito e as oito e meia, de mochilas às costas e empenhando nas mãos o bloco e
o lápis ou caneta, conforme o gosto do freguês. Começaram avidamente a ler as
perguntas que faziam parte de um questionário importante sobre a visita de
estudo, do qual algumas das respostas eram dadas ao longo da mesma. Mal sabiam
eles que essa visita iria durar mais do que esperado, resultando na debandada
de alguns professores e alunos, mas isso veremos mais tarde, deixemo-los
aproveitar o passeio enquanto podem.
Alguns entraram na Brasileira, cafetaria originalmente situada no Rossio, a fim de descobrirem quantas pinturas lá havia, onze seriam elas, outros
seguiram-nos quando se aperceberam que também lhes interessava obter essa
informação. Os professores fizeram uma pequena introdução à Brasileira e ao
Largo do Chiado, nome proveniente do facto de haver tanta pancadaria nos salões
que até os edifícios chiavam, provavelmente também por culpa do Almada
Negreiros, amante de ginástica, que entrava pela Brasileira aos saltos e aos
pinotes, contando curiosidades, histórias de um fontanário, agora inexistente
ali mas existente no Largo de D. Estefânia, que era um dos principais pontos de
chegada do aqueduto das Águas Livres; história de bicas cuja própria palavra
significa beba isto com açúcar devido à amargura que detinha a dita bebida.
Seguiram para o alto de Sta.
Catarina, lugar do Miradouro do Mostrengo Adamastor, de onde as pessoas ficam a
ver navios. Passaram pela Rua da Horta Seca, aqui o professor António Farinha,
explicou aos seus alunos que ali se situava o Palácio do Manteigueiro ou
Palácio da Horta Seca, atual Ministério da Economia e do Emprego. Continuaram
a sua jornada por algumas ruelas até chegarem ao Miradouro, destino pretendido.
Maria José, Maria Varela, Flávia Miguel, Ana Rita Pires e Inês Gomes
apresentaram alguns textos sobre o hediondo Mostrengo referido na obra de
Fernando Pessoa, Mensagem e n’Os Lusíadas de Luís Vaz de Camões,
não o referi na minha obra porque para monstros bastam os homens. Continuaram a
caminhada, passaram pelo Largo do Picadeiro, parando no Teatro S. Carlos para
admirar uma estátua de ferro em honra ao tal Fernando Pessoa, que vai ser
referido ao longo desta jornada até dizer chega, que consistia num homem com
cabeça de livro, coisa estranha, banal nestes dias. Inês Gomes, Ana Rita e
Sofia Azevedo leram o poema “Qualquer música”, devido ao facto do pai de Pessoa
ser um crítico de música, Andreia Ratão e Inês Barreto leram o poema “Ó Sino
da Minha Aldeia”, a propósito de ali se encontrar a casa onde Fernando Pessoa
nasceu e viveu grande parte da sua infância.
Chegaram ao Largo das Belas Artes,
onde se localizava a Biblioteca Pública, muito frequentada por Pessoa que ali
ia para devorar livros, e o Convento de S. Francisco, atual Faculdade de Belas
Artes, futuro destino de alguns Arroianos. Ali ao lado, na Calçada nova de S. Francisco,
tinha havido um grande incêndio que destruiu todas as padarias que ali havia.
Foi prometido aos padeiros que haveriam de ser construídas padarias para estes
voltarem a trabalhar, mas tal promessa nunca foi cumprida. Isto lembra-me da
promessa feita pelo Rei aos frades no meu romance Memorial do Convento.
Neste caso, seriam os arquitetos a não ter filhos se construíssem as padarias,
mas teriam sítio para comprar pão.
Voltaram à Rua Garrett para
visitar a Basílica dos Mártires onde Pessoa fora batizado. Alguns dos
pequenos, que na época de Baltasar e Blimunda já seriam grandes, entraram na
dita basílica para observar o presépio de Machado de Castro que lá estava e o
magnífico teto verde e rosa de Pedro Alexandrino. Sem perder tempo, caminharam
até ao Elevador de Santa Justa para poderem ver as vistas, deparando-se com o
grupo de loiros muito brancos que ocupavam todo o espaço do Elevador, voltaram
para trás, vendo já caídos o Carmo e a Trindade.
A estação do Rossio era a próxima
paragem, do estilo Manuelino e portas em forma de ferradura, sempre foi a estação
de comboios principal de Lisboa. Desceram as escadas rolantes até à entrada
principal onde duas moças da turma das sedas e das lãs leram um texto sobre a
estação. Saíram para o exterior e duas protegidas de Elói, Maria José e Maria
Varela, era o nome delas, leram o poema “D. Sebastião, Rei de Portugal” da Mensagem.
No largo de João da Câmara onde Ofélia era secretária de uma empresa, um trio
de alunos de têxteis leram cartas de amor de Fernando Pessoa a Ofélia. Retornaram
ao Largo do Rossio, lugar onde se situava originalmente a Brasileira, desta vez
para merendar, visto que já era hora de recompensar o corpo pelo esforço que
fez e fará. Acabado o banquete, escutaram, sentados ao lado da estátua, poemas
de Pessoa e excertos do meu romance, que tratavam de algumas viagens de
Baltasar por Lisboa, lidos por quatro alunos de têxteis muito agasalhados,
devido às condições do tempo, que não eram de todo favoráveis.
Passaram por várias ruas
lisboetas, como a Rua da Assunção, a Rua Augusta, a Rua dos Sapateiros, a Rua
do Ouro, a Rua da Vitória, a Rua S. Julião, lendo sempre poemas e excertos das
três obras que estão a estudar. Como todos os caminhos vão dar a Roma, eles
foram dar ao Terreiro do Paço, onde seis dos aspirantes a ourives, Francisco Pastor,
Tatiana Marques, Ana Potier, Inês Duarte e Diogo Madeira, leram excertos da
minha obra e da do Fernando Pessoa, relacionados com aquele espaço e com
espaços que supostamente iriam visitar, como a Casa dos Bicos, o restaurante
Martinho da Arcada e o Campo das Cebolas, mas que não tiveram tempo para tal,
como tinha previsto no início deste relatório.
Finalizadas todas as leituras,
explicações e curiosidades, foram todos para seu lado, saindo de lá, talvez, um
pouco mais cultos do que eram.
Inês Pires Duarte 12ºD
nº14
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