domingo, 16 de junho de 2013

Trabalhos vários; com Eça e Cesário pelas páginas

“O Sarau” (pelos olhos de Rosa)
Estava no Salão com a minha mamã naquela noite. O Salão estava sobrelotado, o teto era de um tom de esmeralda fria e marmórea. As paredes estavam vestidas com quadros renascentistas e com um papel de parede amarelado com tons de mostarda.
Agarrei-me às saias da mamã para não me perder ou ser arrastada pelas pessoas passantes.
-Rosa, não saias daqui, sim?
- Sim mamã.
As cortinas vermelhas abriram-se, todos batiam palmas enquanto um senhor alto, esguio, de fato preto, se sentava à frente do piano. Dali nasceu uma melodia calma e triste que encheu toda a sala de um ambiente tranquilo. Todos escutavam com atenção, olhando para o pianista através dos seus monóculos.
A melodia abrandou e evaporou-se no ar, o pianista levantou-se, fez uma vénia e despediu-se, saindo do palco nos seus sapatos brilhantes.
- Gostaste Rosa?
-Sim.
Atuaram mais três senhores, todos mais velhos do que o primeiro, mas a sua música era mais agitada e furiosa. Deixavam o ouvido inquieto.
Saímos do Salão muito tarde, agora a noite até parecia silenciosa.


“Resposta da Frígida ao poema de Cesário Verde”
Como ousa este poetazinho ofender-me?
Que cousa fiz eu para merecer tal fama?
Venho por este meio defender-me
Do homem que nunca ama.
Segue-me pelas ruas do Chiado
Na esperança de algum reconhecimento.
Não censuro por ter olhado
Mas cuidado, com o meu temperamento.
Repare, não tenho medo de si,
Mesmo quando o vejo ao anoitecer.
A minha boca ainda sorri
Enquanto a sua visão pode esmorecer.


“Cesário verde, o fugitivo”
-Oh não! Fui sugada pelo livro de Português! Mas onde estou? Fui parar ao Chiado do século XIX!
Olho para um lado e para o outro, vejo casais passeando descansados. Reparei num homem encostado numa esquina com um bloco e lápis na mão e escrevia freneticamente enquanto olhava para as pessoas.
-Cesário! Cesário! Fiquei presa nos teus poemas e não sei como sair daqui!- gritei eu dirigindo-me a ele.
Assustado e surpreendido começou a correr rua abaixo, fugindo de mim.
-Cesário espera! Preciso da tua ajuda!
Tentei segui-lo, mas perdi-o num cruzamento. Encontrei uma senhora alta e bela, de vestido luxuoso.
-Minha senhora, viu por onde foi Cesário verde? É um homem alto, magro, de cartola e tinha um bloco na mão.
-Vi o poetazinho sim. Foi por aquela rua. Se o encontrares, diz-lhe para parar de me irritar e andar atrás de mim, sim? Não tenho tempo nem paciência para essas coisas.
-Obrigada!- respondi, já a correr pela Rua do Ouro.
Dobrei a esquina e lá estava ele a tentar recuperar o fôlego ainda meio desnorteado.
-Cesário só preciso da tua ajuda para voltar a casa!
-Largue-me, deixe-me em paz que não a conheço!- gritou, desatando a correu outra vez.
Para poeta até corria bastante rápido e para meu azar, dez minutos depois, perdi-o novamente! Deambulei um pouco pelas ruas, a ver se o encontrava, mas nada…
Olhei para um prédio e reparei numa senhora de ar tristonho a engomar roupa junto à janela.
-Desculpe, minha senhora! Viu passar por aqui um poeta corredor? Preciso de falar com ele!
Ela olhou para mim, surpreendida por alguém falar com ela e respondeu-me:
-Vi sim, menina. Ele é meu vizinho. Penso que acabou de entrar em casa. É essa porta verde aí à frente.
-Obrigada!
A porta que dava para a rua estava destrancada. Subi até ao 3º andar e bati à porta.
-Quem é?
- Sou eu, Cesário, o teu amigo Silva!- respondi, fazendo voz grossa.
Ele abriu a porta e eu entrei de rompante.
-Cesário ajude-me! Preciso de sair deste poema e voltar para casa!
Muito relutante, escreveu-me um poema mais moderno e mandou-me lê-lo. Era tão grande, tão grande que adormeci!

Quando acordei, estava em casa.

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