domingo, 6 de maio de 2012

Tal como Cesário, portador de outra doença qualquer




  Revejo em Cesário, o que já me consome. Não vejo senão outra coisa qualquer que não doença, se por acaso intitulou de “Ao Gás” umas das quatro partes do seu mais emblemático poema, “O Sentimento de um Ocidental”. Não vejo como não sendo transtorno, se Cesário já retratara Lisboa – arrastando-a sobre “passeios e impuras” entre os “moles hospitais!”.
  Esta Lisboa, principalmente a de hoje – ou a que provém de alguns tempos, poucos, atrás, nunca se vira tão melancolicamente retratada, como o fez o poeta. Seria ele um defensor da arte enquanto patriota, ou estaria ele realmente doente para vê-la tão obscura e mal trajada?
 Era realista, verdade – fora outrora naturalista, também. Mas, o impressionismo o subscrevera na forma poética com que se envolvera.
 Sendo o impressionismo forma configurada observada aos olhos do pintor, quem me assegura, se os dele não estariam: turvos, amarelos, infetados, em “debuxo”. É certo que capacidades e génio não lhe faltaram, mas tanta inspiração e tão impressionada, que: ou ele lidara tão equivocamente com tais pestes ou ele próprio as sentira.
  E eu o vejo em mim, também. Porque me encontro em gostos de escrever sobre amor, sorte e aflição; mas em mim reconheço, doença crónica, de poeta, de desgosto interno pela verdade mal encarada e tão polémica que vemos hoje. Onde já se vira, agora, por Lisboa, jogarem-se corpos fora depois de uma noite louca e escaldante, aos recantos de jardins reais sobre a forma de... uso e deita fora. Cesário já o vivenciara certamente, e prever o futuro, também o soubera, apesar da cor.
 Adoro as expressões que usa, a real profundidade do núcleo vivo das coisas: “Não poder pintar/Com versos magistrais, salubres e sinceros”; “Dó da miséria”; “Compaixão de mim”.
  Reconhecera ele, tão doentia característica? Ou devo eu reconhecer tal verdade aos meus pés? Será realmente doença ou não será senão outra arte poética?

Gabriel


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