sábado, 19 de maio de 2012

Um Sarau


Clair de lune ao luar

Clair de Lune, Debussy.
Já assisti a uns três saraus deste Senhor, com S grande. A minha admiração por ele é do conhecimento, penso, de todas as minhas companhias, seja da manhã, da tarde ou da noite. Inevitavelmente, quase todas as minhas conversas de qualquer hora do dia acabam com um suspiro, ao relembrar aquela a quem já trato por ‘’Minha bela música’’. Mas a verdadeira razão por que anseio, de todas as vezes, o começo, o meio e o fim desta melodia não é o facto de a achar linda, magnífica ou qualquer um dos outros adjetivos que é se calhar suposto utilizarmos quando falamos numa música da qual gostamos muito. A verdade é que ela me faz pensar, liberta os meus pensamentos e confesso que mal a oiço, mas os meus pensamentos voam ao som das suas notas.
Uma vez mais aqui estou. Convidada, num dos camarins mais invejados do teatro e com a companhia mais invejada das senhoras. Inveja é de facto o que não falta por aqui e por entre este meio de classes que são (ou pensam ser) ricas, mas não são ricas coisas. Vêm, mesmo sem conhecerem uma única música ou até sem nunca terem ouvido falar em tal nome. Enoja-me sabem? Saber que não se sabe nada e nem assim procurar saber.
As primeiras notas são tocadas com aqueles dedos longos e finos, elegantes. Fizeram-me lembrar os dedos de Carlos e de quando agarrou na minha mão para me convidar, muito alegremente, para um sarau de Debussy. Esboço um pequeno sorriso e, pelo canto do olho, olho para ele que está ao meu lado e para o seu ar muito atento. Parece ainda mais bonito ao luar da música.
A música está apenas no começo e decido ouvi-la, mas desta vez a sério. Não posso continuar a não saber sequer a melodia da minha querida música. Inconscientemente sabia que ela era linda, mas agora, ao ouvi-la como nunca havia ouvido antes, admiro-me como algo pode ser tão belo. É uma beleza que se ouve, que se sente e quase se inspira. Parece que a cada nota, dezenas de passarinhos saem de dentro do lindo piano preto  e voam por cima das nossas cabeças muito lenta e silenciosamente. É quase como a vida. Começa devagarinho, agita-se lá pelo meio (com algumas partes verdadeiramente agitadas!) e termina como começou. Os dedinhos mexem-se tão rápido que tentar acompanhar os seus movimentos deixa-me zonza. Mas a música continua bela e mais bela ainda se torna com o meu amor a meu lado.
Quando a música termina, com aquele toque de génio de Debussy e o parar do balançar do seu corpo forte, Carlos gira as suas pernas na cadeira e, enquanto todos se levantam e aplaudem intensamente o músico que agora se encontra virado para eles e a fazer consecutivas vénias, pergunta-me muito devagar e discretamente, por entre um sorriso tímido:
– Como achas que está o luar lá fora, minha querida Maria?

Joana Tomás
Nº 16
11ºD

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